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Casos de doença ligeira deixam de ser atendidos na urgência
O Governo acaba de dar o primeiro passo para retirar das urgências hospitalares os casos pouco graves, não-urgentes, e reduzir a procura excessiva destes serviços. No futuro, se a medida que se antevê impopular avançar nos moldes que o Ministério da Saúde e a Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS) delinearam, os doentes triados com pulseiras azuis ou verdes que cheguem à urgência pelo seu pé passarão a ser encaminhados para consulta, no mesmo dia ou no dia seguinte, num centro de saúde ou em hospital de dia. Ou seja, fora da urgência hospitalar, como acontece noutros países.
A limitação do acesso aos serviços de urgência nas situações pouco graves está definida num projecto de portaria oriundo do gabinete do ministro da Saúde a que o PÚBLICO teve acesso e que vai ser colocado em consulta pública durante 30 dias. Para ser atendido na urgência, estipula-se, o doente passará a ter que ser previamente referenciado pelo Centro de Orientação de Doentes Urgentes do INEM, pelo SNS24, pelos cuidados de saúde primários, por um médico com “informação clínica assinada” ou por outra instituição de saúde.
Os adultos até aos 70 anos (o diploma não inclui as crianças e adolescentes e as pessoas mais idosas) que cheguem à urgência hospitalar pelo seu pé e sem referenciação prévia passarão a ter que ligar primeiro para o SNS24, dentro do próprio hospital, onde lhes será disponibilizado “um telefone instalado no local” para esse efeito. Caso o utente recuse ou não seja possível o seu encaminhamento através do SNS24, será sempre inscrito no serviço de urgência e avaliado na triagem. Mas, se receber uma pulseira azul ou verde — casos considera dos pouco ou não-urgentes, de acordo com a triagem de Manchester, um sistema de escalonamento de priori dades que permite classificar a gravidade da situação —, não será atendido na urgência, desde que tenha consulta garantida no mesmo dia ou no dia seguinte no centro de saúde ou em hospital de dia. Ainda assim, a lista de excepções à obrigatoriedade de avaliação no serviço de urgência é longa. Desde logo, exceptuam-se os mais idosos (a partir dos 70 anos), além dos doentes acamados ou em cadeira de rodas, as vítimas de trauma e os doentes com situações agudas do foro psiquiátrico e obstétrico e as grávidas. As excepções incluem ainda os pacientes com hemorragias gastrointestinais ou vaginais, com infecções locais e abcessos, com problemas oftalmológicos, os que sofreram quedas ou queimaduras e todos os que tenham antecedentes de doença oncológica activa, doença renal crónica ou doença arterial periférica, entre outras situações.
As restrições vão avançar de forma faseada, dado que estão “condicionadas pela capacidade de resposta dos diferentes níveis de cuidados”, que é “significativamente discrepante ao longo do território nacional”, refere o projecto de portaria. Caberá à Direcção Executiva do SNS, que idealizou esta medida, “o dever de verificação e demonstração da observância” dos requisitos necessários à concretização do novo modelo de funcionamento. Estipula-se ainda que o disposto na portaria será aplicável a todos os estabelecimentos do SNS logo que na respectiva área de influência haja as necessárias condições “que serão demonstradas por deliberação da DE-SNS, a emitir com antecedência de 30 dias”. A DE-SNS fica incumbida de definir o calendário de implementação, que, reforça-se, “deverá ocorrer de forma faseada”. 40% são pouco urgentes No despacho em que justifica o projecto de portaria, o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, sublinha que a circunstância de “muitas vezes” acorrerem aos serviços de urgência hospitalares “doentes em situações de pouca gravidade e sem prévia referenciação clínica” acaba por ter “importantes implicações” na resposta dada aos que “carecem de cuidados emergentes e urgentes”.
Neste contexto, frisa, “em nome da efectividade, da eficiência, da qualidade dos cuidados prestados e da optimização dos recursos, entende-se ser de proceder à definição da forma como os estabelecimentos e serviços prestadores de cuidados de saúde do SNS desenvolvem respostas de proximidade às necessidades assistenciais em situações de urgência”. A revolucionária medida avança numa altura em que a percentagem de doentes triados como não-urgentes que chegam aos Serviços de Urgência tem vindo a aumentar nos últimos anos. No final de 2022, atingiu mesmo o valor que era, então, o mais elevado desde 2015, de acordo com os dados disponíveis portal do SNS. Nessa altura, mais de 44% dos doentes que recorreram às urgências tinham sido triados à entrada com as cores verdes, azuis e brancas.
c/Público